sexta-feira, 30 de novembro de 2012

As crianças Suruwahás mortas


O jornalista australiano Paul Raffaele manifestou indignação, em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH) nesta quinta-feira (29), com o que chamou de tolerância do governo brasileiro à prática do infanticídio em tribos indígenas isoladas.
Um crítico da Austrália sobre os problemas brasileiros.
Durante cerca de duas semanas de convivência com os índios Suruwahás, no Sudoeste do Amazonas, para produzir o documentário Amazon's Ancient Tribe  First Contact, Paul constatou que o grupo incentiva o assassinato de recém-nascidos deficientes ou filhos de mães solteiras, por acreditarem que são maus espíritos.
O jornalista afirmou que a Funai, e consequentemente o governo brasileiro, faz vista grossa à prática e que essa tolerância escapa de sua compreensão.
 Acredito que a Funai seja o órgão errado para administrar os territórios indígenas. O departamento está cheio de antropólogos que querem proteger a pureza cultural dos índios, mesmo quando isso envolve enterrar bebês vivos ou abandoná-los na floresta para serem comidos vivos por onças e outras feras  destacou.
Paul Raffaele disse discordar da política da Funai e do governo brasileiro de tentar manter tribos indígenas isoladas do resto da sociedade. Segundo ele, ao agirem assim, concordam e aprovam com uma das piores violações aos direitos humanos em todo o mundo.
 Não consigo entender por que não há, no Brasil, uma grande discussão a respeito do assunto. Como o povo brasileiro aceita as regras desses antropólogos? Não conheço nenhum outro país no mundo que aceite crianças enterradas vivas  ressaltou.
O jornalista, que trabalha há cerca de 50 anos visitando tribos isoladas, disse que, na maioria dos locais em que esteve, os jovens queriam ter contato com o mundo externo para buscar formação educacional e conhecimento. Raffaele afirmou que a Funai desencoraja esse tipo de atitude e incentiva os índios a permanecer na “Idade da Pedra”.
 Eles não perguntam o que os índios, principalmente os jovens, querem. Eles dizem a esses jovens o que devem fazer. Fecham as tribos no que eu chamo de museu antropológico vivo  disse.
Raffaele lembrou que membros da Funai e do governo brasileiro negam que ainda haja assassinato de bebês e crianças em tribos indígenas, mas ressaltou que existem provas contundentes que comprovam a prática, especialmente entre tribos mais isoladas.
 Não estou falando de algo que aconteceu há séculos. Pode ter acontecido ontem e acontecer amanhã. Está na hora de o governo brasileiro ficar do lado de todas as suas crianças e não apenas daquelas não indígenas  disse.
O senador Magno Malta (PR-ES), autor do requerimento da audiência, criticou a posição dos que defendem o ato como uma prática cultural. Ele disse acreditar que a cultura é sempre menor do que a vida e que não há justificativa para qualquer tipo de defesa à morte.
 Deus não criou a cultura, criou a vida  destacou.
Representantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do Ministério Público e parlamentares presentes à audiência ressaltaram a importância do tema e afirmaram que debaterão o assunto dentro dos órgãos, para que possam ser desenvolvidos projetos que levem mais cidadania às comunidades indígenas isoladas.
Os índios Suruwahá vivem em uma área no município de Camaruã, no Sudoeste do Amazonas. O grupo, composto hoje por cerca de 140 pessoas, é também conhecido como “povo do veneno”, devido à prática e veneração do suicídio, que constitui uma das características mais marcantes de sua cultura.
O consultor legislativo Fabiano Augusto Martins Silveira, representante do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), afirmou que as condutas verificadas na tribo podem ser classificadas não só como infanticídio, mas também como homicídio. De acordo com ele, cabe aos órgãos de proteção agir para impedir suicídios e homicídios.
 Não podemos ser tolerantes com aqueles que aceitam ou propagam a morte  disse.

Fonte: https://www12.senado.gov.br/noticias/materias/2012/11/29/jornalista-australiano-critica-tolerancia-brasileira-ao-infanticidio-em-aldeias-indigenas

A questão aqui tratada não é nada simples. Há anos que menciono em minhas aulas sobre imputabilidade penal a questão dos indígenas, justamente por causa de práticas como as descritas acima. Menciono, inclusive, que a questão é jogada para baixo do tapete, omitida ou desmentida, talvez porque alguém sinta medo que o tema ganhe a mídia e, como tudo mais, vire esculhambação.
Exercitando a minha paciência e senso democrático, penso que os assuntos precisam ser discutidos e os mais polêmicos são justamente os que mais precisam de debate. Mas confesso que, longe de ser um xenófobo, ainda assim me incomodo profundamente com um estrangeiro pondo o dedo em nossas caras. Os assuntos precisam ser discutidos, mas pela sociedade brasileira, admitindo-se os estrangeiros residentes no país, porque a estes a Constituição de 1988 conferiu os mesmos direitos e garantias fundamentais, além de que, vivendo aqui, eles comungam de nossas alegrias, tristezas e mazelas. Mas um visitante?
Ainda que respeite o seu conhecimento de causa, haurido em décadas de experiência, incomoda-me que ele critique o comportamento dos brasileiros. Além disso, atacando a FUNAI em um aspecto organizacional elementar, ele acaba por criticar decisões de governo. E todo governo surge do exercício de um sufrágio, direito político que não é concedido a estrangeiros em trânsito por estas terras.
No mais, embora eu não seja partidário de concepções edênicas quanto ao meio ambiente e aos povos tradicionais, o discurso do jornalista sugere uma preferência pela assimilação cultural. Concordo que os índios possam (possam, não devam) manter contatos externos e buscar "formação e conhecimento". Não acho que eles precisem viver na "Idade da Pedra". Mas penso que essa deve ser uma deliberação deles, não de antropólogos (profissionais que respeito, vale destacar), não do governo e certamente não de jornalistas, principalmente se estrangeiros.
Como não é do meu métier, não me atreverei a formular juízos sobre se os índios devem manter-se isolados ou devem integrar-se à sociedade não indígena, sem perder os elementos próprios de sua cultura (estou propositalmente excluindo da conversa a assimilação cultural). E espero sinceramente que pessoas com conhecimento nessa área possam me ajudar a compreender a grave questão, até porque tenho interesses diretos nela, devido aos meus estudos sobre imputabilidade penal.

PS  Quanto aos comentários do senador Magno Malta e do consultor do CNMP, minha opinião é esta aqui: Cala a boca, Magda!

5 comentários:

Anna disse...

Pensei três vezes antes de postar um comentário e só o fiz porque o tema realmente me intriga e porque sou nacional, eu juro rsrsrs.

A mesma "comichão" que me acomete deve atingir a cena pública, mas o debate não flui - acredito - porque a pauta do politicamente correto não permite.

Há uma zona cinzenta muito perigosa neste tema. É cada vez mais difícil compatibilizar particularidades como tutela x autonomia, cidadania x irresponsabilidade, tolerância x permissividade. É possível um poder interno nas comunidades culturalmente diferenciadas que seja "mais soberano que o soberano"? E o que acontece quando há "conflito de leis no espaço"? E o que acontece quando o grupo indígena relaciona-se "na fronteira", com outro não-indígena? Há ainda uma "hipossuficiência"? De quem e em que circunstância? Enfim...

Anônimo disse...

"Deus não criou a cultura, criou a vida"

Lucidez desconhece tabus, afinal, discussões como essas devem ser completamente livres de "agendas" políticas e ideológicas para ser realmente frutífera.

Yúdice Andrade disse...

Espero que sempre cedas às comichões e deixes as tuas inquietações aqui conosco, Anna. Elas sempre alimentam o debate.

Das 14h11, creio que você quis dizer agenda político-partidária, porque político tudo sempre será. Ao fazer essa afirmação, você fez política, não é?

Ruy Romão disse...

Tema interesantíssimo! Principalmente
quanto a repulsa ao pretenso "infanticídio" entre indigenas.
A cultura indígena, inversamente a do branco civilizado, também repugna, o fato de um semelhante seu morrer à mingua, de fome e desamparo em plena selva urbana, nem tampouco entre eles, admite-se, a corrupção e a intolerância. Ou seja, o mesmo sentimento de revolta do branco "civilizado" é, proporcionalmente, esperimentado pelos indgenas, o que varia são as razoes culturais de cada grupo social.
Ruy Romão

Anônimo disse...

Comentário de: Jason

Engraçado que a tal "COMISSÃO DOS DIREITOS HUMANOS" e a "COMISSÃO DE JUSTIÇA", ambas abraçam a causa do LGBT, chegando a confrontar com a opinião pública da sociedade, inclusive querendo impor mordaça na liberdade de expressão que é um estado de direito adquirido e amparado por Lei na nossa Constituição. Agora eu só quero ver essas entidades defenderem a situação dessas crianças indígenas sacrificadas só porque nasceram com algum tipo de deficiência? Onde está a FUNAI (que brigam por terras de comunidades ambiciosas, pelo menos em alguns casos), o ECA, os vários CONSELHOS TUTELARES (espalhados por esse Brasil afora) ou a VARA DA INFÂNCIA, hem!? Só está faltando uma boa parte da classe artística e da mídia dizer que práticas tão bizarras como essas é cultura?
Você não vê esses tais "defensores do bem (quando lhes convém, claro!)", os quais adoram se posar de vítimas e ainda sempre que podem, veem sempre com àquele velho discurso de "vitimização social", querendo impor seus conceitos e ideologias na marra diante da opinião pública da sociedade, tentando de todas as táticas sujas colocar a moral e os costumes como se fossem vilões! Enfim, querem por que querem nos fazer presos de consciência alienados aos caprichos deles (LGBT, PT, PV, PSOL, PRONA, a maioria das centrais sindicais, MST, parte da classe artística e da mídia, etc.). Esses mesmos falam e falam contra as palmadas, no entanto, fazem vistas-grossas pra essa questão e como se não bastassem ainda defendem o aborto! Como dizem os muçulmanos:"não comem um cabrito, mas, devoram um camelo"...