domingo, 7 de abril de 2013

A pessoa que é Emy Mafra

A primeira vez que ouvi falar de Emy Mafra foi lendo uma folha de papel. Durante uma reunião de planejamento docente, que sempre temos no mês de janeiro, nossa colega Ana Darwich, que leciona Sociologia e Metodologia, e hoje minha adorável orientadora de mestrado, forneceu um material que continha um modelo de resumo de texto, tipo de trabalho que costumamos pedir aos nossos alunos (portanto, temos que saber o que pedir, para saber corrigir). O resumo fora feito por Emy e Ana o considerou tão bom que passou a adotá-lo como material didático, para treinar até mesmo outros professores.

Ana elogiou o trabalho de Emy, o que naturalmente me deixou curioso quanto aquela aluna diferenciada. Não achei que fosse ter a oportunidade de trabalhar com ela, pois já cursava penal com outro colega. Mas eis que ela se mudou para a minha turma, onde logo se revelou uma acadêmica interessada, muito preocupada em aprender e muito preocupada com seus méritos. Muitos alunos se importam apenas com a aprovação; os mais sensatos se importam em merecer a aprovação, ou seja, com o quanto aprendem. Emy pertence a este segundo grupo.

Mas Emy é também daquele tipo que não se esconde atrás das supostas grandes dificuldades que muitos alunos adoram invocar para justificar pendências. Mesmo morando em Mosqueiro, não se furtou de acumular o curso com o estágio na Defensoria Pública e com a Clínica de Direitos Humanos, menina dos olhos do nosso curso do CESUPA. Não é de dar desculpas: faz o que precisa fazer e segue em frente. Em suma, é uma aluna que está se esforçando para ser mais do que uma acadêmica regular; está batalhando para construir-se como cidadã.

Acabei de ter uma demonstração disto que afirmei, ao ler esta postagem que Emy publicou em seu perfil no Facebook:

Emy e eu, no dia do encerramento oficial
da disciplina Direito Penal III
(para quem passou direto).
Despedindo-me da Defensoria Pública do Estado do Pará, trabalho nos meus últimos processos criminais. E, além disso, consigo estudar e compreender, pois aplico na prática o que venho estudando atualmente em Direito Penal: Crimes contra o patrimônio. Já está dando uma saudade enorme das pessoas com quem convivi, das pessoas que conheci, das situações surpreendentes que vivenciei. Lá aprendi muito! Não só questões de Direito, mas sobretudo a amar mais ao próximo, a sentir vontade de ajudar, a vislumbrar a realidade como ela é e não da forma como a mídia costuma exibir, contaminando o nosso pensamento com opiniões distorcidas sobre essa mesma realidade.
Lá aprendi que nem todo divórcio é triste. Aprendi que nem todos podem ser passíveis das mesmas exigências. Também pude perceber que nem todo criminoso quer fazer o que faz, que há uma questão muito mais complexa do que se imagina por trás de cada crime. Passei a entender que há pais que não pagam uma pensão alimentícia porque nasceram de mães solteiras, foram registrados apenas no nome delas e estas conseguiram criá-los - não que seja o correto, mas, de alguma forma, eles cultivam a crença, muitas vezes sem maldade, que estão isentos dessa obrigação.
Enfim, nada é como aparenta ser à primeira vista. Lidar com os problemas de outros seres humanos sempre é uma chance de enxergar como nós nos preocupamos tanto com coisas inúteis, ínfimas, quando temos tudo o que precisamos e mais um pouco. Porém, essa percepção, bem como nossas atitudes, podem se modificar quando observamos que o próximo sobrevive com muito menos do que aquilo que consideramos necessário e, ainda assim, não se cansa de viver.
Portanto, é uma tristeza "abandonar" essa atividade que tanto amei fazer, num lugar em que muito aprendi, mas preciso seguir um caminho em que a vida me colocou. Precisei fazer uma escolha que, nesse momento, se fez necessária.
Vou seguir, tentando me encontrar, arriscando, enfrentando esse novo desafio. E sem desistir, sem cansar de viver, levando na mente, na alma e no coração tudo o que absorvi até agora.


Comovido com seu texto (e sendo eu a pessoa que leciona para ela direito penal, neste momento, reconhecendo um pouco das minhas idiossincrasias em suas palavras, como na crítica à mídia), deixei-lhe um comentário:

Que belo testemunho, Emy Mafra! Eis aí um estágio que valeu a pena: você aprendeu direito, porém mais do que isso, aprendeu humanidade. Aprendeu a ver o que há fora da caixinha, além dos preconceitos e dos juízos de valor que as pessoas cultivam simplesmente para vencer as batalhas de opinião que elas mesmas criam. Sempre te tive respeito, mas ele agora evoluiu para o nível da admiração.

Em nossas carreiras docentes, sempre nos defrontamos com alunos dedicados e sérios, que valorizam o nosso trabalho e nos provocam uma sensação de recompensa. Com menos frequência, porém, aparecem aqueles que chamam a atenção particularmente. Cada professor tem o seu motivo. O meu tem a ver com esse rio profundo de sentimentos humanos que Emy escolheu para ser o cenário de sua vida. Hoje, eu me ergo em reconhecimento a isso. Porque acho que certas coisas precisam ser ditas publicamente.

Eu me orgulho de você, Emy.

PS  Elogio adicional: repararam que texto bem escrito o dela? Nada fora do lugar, nada! Isto também é raríssimo, hoje em dia.

3 comentários:

Juliana Coelho disse...

Professor, é por essa e por outras que lhe tenho enorme admiração! Muito emocionante a sua postagem homenageando uma pessoa tão especial como é a Emy! Beijos!

Yúdice Andrade disse...

Ela merece, Juliana. Como os comentários no Facebook, vindos de diversas pessoas, demonstram.

Unknown disse...

É a primeira vez que entro em seu blog professor, depois de tanto querer conhecê-lo. E é com grande alegria. que digo o quanto lhe admiro, antes mesmo de ser sua aluna (pois quero muito ser), ouço inumeros elogios sobre o senhor, e ao longo desse tempo em que ouvi tais comentários fui criando uma visão que confirmo agora, realmente o senhor não é tudo o que falaram, é muito maiiiiiis!!!! Meus parabéns pelo mestre que é e por reconhecer na Emy a imagem que eu compartilho com o senhor, admirável!
Boa tarde professor, e lembre-se, deixo aqui destacado o meu anseio em ser sua aluna! Att, Sabrina.