sábado, 25 de outubro de 2014

Falando em português: carta de intenções

Sou professor há 15 anos. E professor universitário, o que induz a conclusão de que lido com um público que acumulou razoável quantidade de conhecimento em diversas áreas, a começar pelas mais básicas. Suponho que o conhecimento do idioma que falamos é um dos mais elementares, afinal nos comunicamos o tempo inteiro, portanto a experiência cotidiana deveria ajudar-nos a aprender e a reter o que aprendemos na escola.

Para piorar, o direito é um campo que depende muito particularmente da eficiência comunicacional, de modo que sempre escutamos dizer que o profissional do ramo tem uma necessidade maior do que outros de se expressar de maneira correta. Além disso, trata-se de uma carreira mais comumente procurada por quem gosta de ler e o simples hábito da leitura já colabora bastante para a compreensão da língua.

Infelizmente, essa não é a realidade. As pessoas destroem a Língua Portuguesa o tempo inteiro. Não se trata de erros justificáveis, oriundos da flexibilidade da linguagem falada, tais como "me dá" em vez de "dá-me" (a próclise parece tão pedante!) ou a alternância errática entre formas de tratamento, como em construções do tipo "venha cá, para eu te dar um abraço" (o correto, segundo a norma culta, seria "vem cá, para eu te dar um abraço", a partir do pronome pessoal do caso reto tu; e a forma popularizada, que as pessoas supõem ser mais educada [???], construída sobre o pronome de tratamento você, "venha cá, para eu lhe dar um abraço"). Podemos achar lindo o Djavan cantando "Vem me fazer feliz porque eu te amo/ Você deságua em mim...", mas ele é poeta. Nós não temos desculpa, se passamos pelos bancos escolares.

Refiro-me a erros grotescos, intoleráveis, de ortografia, concordância, regência, conjugação verbal, etc. Pontuação, então, quase ninguém mais sabe o que é. Tudo isso evolui para uma incapacidade tão severa de expressão que, por vezes, o indivíduo emprega palavras completamente incompatíveis com a ideia que pretende externar, tornando seu texto ininteligível. Em casos particularmente graves, uma reunião aparentemente aleatória de palavras não permite que se reconheça, sequer, a existência de uma autêntica frase.

Perco muito tempo corrigindo provas porque sofro de uma compulsão que me obriga a corrigir todos os erros que encontro. Corrijo cada vírgula. Mas ao contrário do que se poderia esperar, nesses anos todos, ninguém, absolutamente ninguém me procurou para falar sobre minhas anotações. Nem todas são claras, imagino (por que será que rejeito o tão comum termo "ademais"?), mas ninguém quis saber nada. E como os erros se repetem, só posso concluir que não toquei o coração de ninguém.

Na verdade, eu realmente me apavoro pensando em que tipo de educação essa garotada vem recebendo nas escolas. Será que suprimiram as aulas de Língua Portuguesa do currículo mínimo? Será que todo mundo gazetou essas aulas? Ou será que a nossa alimentação cheia de gordura (e glúten!) afeta as áreas do cérebro responsáveis pela assimilação do idioma? Alguma boa explicação deve existir.

Jamais quis ser mais enfático sobre este tema. Confesso que sempre temi que algum aluno se ofendesse, acreditando em críticas pessoais. Mas a verdade é que, passado tanto tempo, e com a situação se agravando, decidi assumir que sou um educador e, aproveitando-me das facilidades trazidas pela internet, resolvi ser proativo. Daqui por diante, de vez em quando, vou-me atrever, mesmo sem possuir nenhuma formação em Língua Portuguesa que não a das escolas pelas quais passei, a escrever dicas pensadas a partir dos erros que vi mais frequentemente em minha experiência docente.

Espero que minha intenção seja percebida como uma crítica construtiva e que, finalmente, as pessoas que as lerem, particularmente meus alunos e orientandos, porque lidam comigo diretamente, comecem a melhorar efetivamente.

Espero, também, não cometer nenhum deslize nesta empreitada. Mas é bem provável que aconteça, pois este é um trabalho diletante. Como disse acima, não tenho nenhuma formação específica, por isso receberei de bom grado críticas, correções e, claro, ajuda para aprofundar as ideias.

"Falando em português" é o título que indicará as postagens com esta finalidade. Tomara que dê certo.

Nenhum comentário: