quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Conversando sobre cidadania e polícia

Hoje foi uma ocasião profundamente gratificante para mim. Na segunda noite da XVII Semana Jurídica do CESUPA, participei com o minicurso "Manifestações sociais e intervenção policial". O evento nasceu do meu inconformismo com o excesso de arbitrariedade que tem permeado a atuação das polícias pelo país afora, nessa longa trajetória de manifestações públicas que têm ocorrido, nos últimos anos, pelos mais variados motivos.

Vendo o abuso recrudescer, ante a omissão criminosa das autoridades e a concordância, às vezes implícita, às vezes psicopática de expressiva parcela da sociedade, senti que tínhamos o compromisso de  conversar sobre isso com os nossos alunos, já que o projeto político-pedagógico de nosso curso está assentado sobre o eixo dos direitos humanos e porque precisamos formar não apenas profissionais, mas acima de tudo cidadãos.

Mas o evento me trouxe também emoções muito pessoais. Afinal, dividi o tempo com duas ex-alunas extremamente queridas, hoje profissionais valorosas. Lembrei-me delas em sala de aula, tão tímidas, e vendo-as hoje, tão seguras, tão articuladas em suas falas, com tanto conhecimento apropriado, eu realmente me emocionei. A sensação é única.


Nossa noite começou com Vitória Monteiro, integrante do Grupo Cabano de Criminologia, que foi minha monitora e que orientei em sua monografia, sob o tema "A ilegitimidade da criminalização dos protestos no Brasil: uma análise sobre a repressão criminal nas manifestações de junho de 2013 à luz da Criminologia Crítica" (2015), hoje nossa aluna da pós-graduação em ciências criminais, que vem aprofundando suas pesquisas no campo da ação política popular e, graças a isso, nos proporcionou uma importante visão sobre como as manifestações sociais são essenciais para a existência de democracia.


A segunda a falar foi Verena Mendonça, que orientei em sua monografia sob o tema "A aplicação extensiva das penas alternativas como forma de melhorar a situação prisional brasileira" (2012), hoje engajada na docência e que nos trouxe uma visão desenvolvida em sua pesquisa no mestrado, destinada a compreender, justamente, a instituição Polícia Militar, inclusive investigando a autopercepção da tropa.


Fui o terceiro a falar e me concentrei nos aspectos constitucionais que fazem do Brasil, segundo consta, um Estado democrático de Direito, em sua oposição ao Estado de polícia, ora fortemente em expansão. Usei como estratégia a exibição de vídeos sobre ações policiais reais e recentes, para confrontá-las com os mandamentos constitucionais. Mas não com uma perspectiva de demonização da Polícia Militar, porque cada vez mais defendo a necessidade de trazer essa instituição para os debates sobre conquista da cidadania. E aí apresentamos o nosso trunfo.


O Cabo PM Luiz Fernando Passinho, coordenador geral da Associação de Defesa dos Direitos dos Policiais Militares do Estado do Pará, abriu os meus olhos e, claramente, também os dos alunos, sobre aspectos que nunca passaram por nossas cabeças. Com sua visão interna da questão e grande conhecimento dos problemas relativos à segurança pública, Passinho nos falou sobre a exclusão de que padecem os policiais, também eles recrutados entre a juventude negra da periferia, que acabam se tornando algozes de seus pares, tragados por um sistema impiedoso que não os reconhece como sujeitos de direitos. As reflexões que ele nos trouxe quebraram paradigmas.


Necessário registrar um agradecimento especial aos nossos alunos, que aguentaram uma apresentação que extrapolou o horário e, mesmo assim, alguns ainda ficaram mais um pouco para debater. Os questionamentos, dirigidos todos ao nosso convidado Passinho (o que considerei excelente: os alunos não desperdiçaram a oportunidade), permitiram um diálogo pautado na empatia, que é a base para a construção de relações solidárias. Com isso, nosso minicurso alcançou os objetivos que tínhamos. Só posso desejar que os alunos tenham gostado como nós.

Um comentário:

Hudson Andrade disse...

Minha imensa alegria e gratidão. O mundo precisa de acoes pelo bem comum.
Que tal levar essa fala para meus adolescentes?